Ilhabela, como o nome sugere, é uma ilha, cercada de água por todos os lados. A maior parte das pessoas e todos os carros que vêm para cá passam obrigatoriamente pela balsa. Carros e pedestres passam por uma espécie de funil e podem ser observados um a um durante a travessia. Eles ficam presos durante 15 ou 20 minutos dentro de uma balsa. Embora a Ilha de São Sebastião seja grande, o município de Ilhabela é pequeno, quase todo ele limitado a uma linha que se estende entre Jabaquara e Borrifos.
Diante disso, recuso-me a acreditar na impossibilidade de prevenir e investigar crimes. Recuso-me a acreditar que não há nada que se possa fazer para combater a criminalidade que atinge Ilhabela.
Muitas coisas podem ser feitas e não são feitas não porque exigem uma estrutura cara, um sistema de alta tecnologia ou mão-de-obra numerosa. Elas não são feitas simplesmente porque não se quer, porque não há ninguém que exija que os responsáveis cumpram um pouquinho mais do que suas obrigações.
Se eu fosse o responsável pela segurança de Ilhabela, ficaria envergonhado ao saber das estatísticas de roubos no município. A repetição de um mesmo tipo de crime demonstra a ineficiência da polícia e da justiça em combatê-lo. Quando bandidos se acostumam com um determinado tipo de crime, algo está errado -- e não é apenas a voracidade dos marginais.
É claro que a população deve fazer sua parte. A denúncia é uma arma poderosa no combate ao crime; ela demonstra que a sociedade não está disposta a se curvar diante da ação dos bandidos. Esses criminosos não vivem isolados; eles têm comparsas e receptadores de objetos roubados; eles têm parentes e amigos que toleram seu banditismo. Como se trata de sujeitos covardes totalmente desprovidos de escrúpulos, não há criminoso que não esteja disposto a denunciar seu parceiro de crime. Para que a denúncia exista, basta que ele vislumbre a recompensa adequada.
A melhor recompensa para quem denuncia um criminoso é não ir para a cadeia. Cumplicidade é crime, assim como a receptação de objetos roubados. A única atitude correta quando se tem conhecimento de um crime é denunciá-lo e denunciar seus autores.
Embora problemas como o desemprego e a corrupção sejam preocupações constantes para a população brasileira, nada se compara com a violênicia urbana. Não há nada mais importante do que a certeza de poder voltar são e salvo para casa, de não ter sua casa invadida por marginais, de não ser vítima de um assalto, de um seqüestro ou da guerra entre traficantes. Não há nada mais importante do que viver num lugar totalmente livre de violência. É claro que é impossível encontrar um lugar assim. Onde há pessoas há pelo menos a possibilidade da existência de crimes. Mas é possível reduzir essa possibilidade com ações preventivas simples, com leis severas, com investigações e policiamento eficientes.
O crime existe onde há espaço para ele. O criminoso é covarde por definição; ele buscará sempre as situações onde os ganhos e a possibilidade de sucesso são maiores. Ele evitará lugares em que a polícia é eficiente, em que a população não tolera sua presença e está devidamente protegida e prevenida contra sua ação.
Ilhabela não parece ser um lugar assim. O crescimento rápido e desordenado atraiu todo tipo de criminoso. A criminalidade crescente manchou sua tranqüilidade original. O paraíso acabou, não apenas porque praias e cachoeiras estão poluídas, mas também porque a violência tomou conta da cidade. Muitas pessoas deixaram as grandes cidades para viver em Ilhabela e viram-se forçadas a levar aqui o modo de vida que tinham antes, com grades, cercas elétricas, vigilância particular e a mesma insegurança que as aterrorizava.
Tudo isso me surpreende, não por ter sempre julgado Ilhabela imune à violência que afeta todo o país, mas justamente porque este lugar tem características propícias a que esse problema seja controlado por aqui. Citei, no início deste texto, características físicas que permitiriam ações preventivas. As dimensões e os limites físicos bem definidos facilitam investigações, o controle de entrada e saída do município e a vigilância constante. Não são ações impossíveis ou difíceis. Por que não colocá-las em prática? Por que abandonar a população à própria sorte? Por que agir como se nada estivesse acontecendo?
Convido cada internauta de Ilhabela a divulgar este texto a seus amigos e conhecidos, a divulgar suas experiências com a falta de segurança nesta cidade, a relatar, ainda que anonimamente, suas tragédias pessoais. Não peço isso para que criemos a idéia de que estamos vivendo num inferno -- embora para muitas pessoas isso seja verdade --, mas para que talvez os responsáveis por melhorar as condições de segurança em Ilhabela efetivamente façam algo.
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Estatísticas oficiais sobre os índices de criminalidade de Ilhabela podem ser obtidos no
saite da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo.