segunda-feira, julho 26, 2010

Vende-se Ilhabela



Uma cidade é feita principalmente de casas. Uma cidade só merece este nome quando pessoas se associam a um lugar ao ponto de nele desenvolverem suas vidas. Esta associação só se realiza quando estas pessoas começam a construir casas nesse lugar e quando estas casas são realmente usada como tais, isto é, quando cada casa efetivamente se torna o lugar de comer, de dormir, de constituir e reunir a família, de conservar objetos, memórias, costumes e tradições. Antes disso uma casa é apenas uma construção, como um galpão, uma ponte ou um muro de arrimo.

À medida que as casas são usadas como casas de verdade, cidades tornam-se cidades de verdade. Então, memórias, costumes e tradições, assim como princípios e valores, antes restritas aos limites de cada família e de cada casa, transbordam para ruas, praças, escolas, associações, bares, cafés e outros espaços coletivos. Assim se faz uma cidade de verdade.

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Uma das vantagens de pedalar é poder observar mais detalhes das cidades e saber até que ponto elas são "de verdade" ou não. Motorizadas, as pessoas deslocam-se rápido demais ou ficam isoladas demais daquilo que a cidade realmente é. Pedalando tenho notado um fenômeno curioso (e preocupante): há cada vez mais casas à venda em Ilhabela. O que isto significa?

Se admitirmos que todas as pessoas que tentam vender suas casas em Ilhabela estão querendo apenas mudar de bairro, casas colocadas à venda são apenas casas colocadas à venda. Mas se fizermos uma suposição mais razoável, a de que muitas dessas casas foram colocadas à venda por pessoas que as tinham como investimentos e por pessoas que pretendem sair de Ilhabela, então surgem motivos para preocupação. Em outras palavras, isto significa que Ilhabela está à venda. Mesmo que poucas casas sejam vendidas, a enorme oferta de imóveis demonstra algo sério: as pessoas que têm casas em Ilhabela estão cada vez menos dispostas a construir suas vidas nesta cidade. Portanto, estas casas já não são casas e a cidade aos poucos deixa de ser uma cidade de verdade -- trata-se de uma conveniência urbanística, assim como aquelas casas são mera conveniência financeira.

Ora, um lugar cujo solo não recebeu raízes é um lugar sem vida -- e a partir daí não é necessário dizer mais nada, mas observar a realidade com mais atenção e lembrar que uma planta que cresce isolada tem menos chances de sobreviver.

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