domingo, março 04, 2012

Santuário Ecológico Marinho de Ilhabela JÁ


Acompanhei a manifestação realizada ontem na Vila pela sociedade civil contra a ampliação do porto de São Sebastião. Entendo os elementos emocionais que levam à realização de tais ações, mas, na melhor das hipóteses, coisas assim são muito ingênuas. Digo isso por dois motivos.

O primeiro é o fato de que manifestações públicas por definição não propõem nada. E a manifestação de ontem não foi diferente; seu resumo é «não queremos o porto, o porto é mau». Essa foi a «mensagem» transmitida, em nada diferente do que já vem sendo dito há muito tempo inclusive por pessoas mais esclarecidas e mais dispostas a buscar e a transmitir informações consistentes.

O segundo é o fato de que quem precisava receber a mensagem dificilmente se abalará com um punhado de crianças e adolescentes obviamente bem intencionados gritando palavras de ordem repetidas ad nauseam em redes sociais. Desde o Fora Collor, políticos e burocratas estão absolutamente acostumados a lidar com manifestações públicas. É compreensível que pessoas em idade escolar se disponham a isso, mas não é compreensível que até hoje não tenha surgido uma idéia, uma estratégia, um caminho que realmente indique que há alguma possibilidade real de que o governo desista das suas birutices.

Mas eis que surge uma idéia.


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Antes de prosseguir, reproduzo aqui um outro trecho, de meu último post:

O Litoral Norte só não se tornou uma porcaria total porque o mesmo Governo do Estado São Paulo que agora quer fazer porto e rodovia topou criar áreas de preservação permanente, como o Parque Estadual da Serra do Mar (2004) e o Parque Estadual de Ilhabela (PEI, 1977):

"No inverno de 1976, o Estadão trouxe uma reportagem de página inteira, dando conta que, na Câmara de Ilhabela, estava tramitando um projeto de lei de uso e ocupação do solo, dispondo sobre um novo zoneamento para o município, permitindo a ocupação das encostas de toda a Ilha de São Sebastião até a cota de 600 metros de altitude. Para se ter uma noção do que se trata, em Ilhabela são raras, hoje, as edificações localizadas acima da cota 120. Alarmado, o professor doutor José Pedro de Oliveira Costa, catedrático da USP que trabalhava na criação do Parque Estadual da Serra do Mar, levou a questão ao secretário estadual do Planejamento Jorge Wilheim, visto que naquele tempo nem secretaria do Meio Ambiente existia. Ambos decidiram que, a única maneira de colocar o arquipélago a salvo da especulação imobiliária seria a urgente criação de um parque estadual."

O trecho acima foi extraído do editorial do jornal Canal Aberto, com o título "Entre o Dramin e São Sebastião" (Ilhabela, 27 de junho de 2008. Editorial, p.2). A lei a que se refere o editorial é a lei municipal nº 63/1976, que “dispõe sobre o uso do solo no município de Ilhabela e dá outras providências”. A lei aprovada previa ocupação urbana até a cota planialtimétrica de 400 metros. Felizmente, com o decreto que criou o Parque Estadual de Ilhabela, a lei municipal nº 63/1976 simplesmente não foi colocada em prática. Anos mais tarde a lei municipal nº 98/1980 veio substitui-la definitivamente.

Em resumo: falando português claro, em meados dos anos 70, o poder público municipal queria cagar em Ilhabela. O poder público estadual, via USP e Secretaria Estadual do Planejamento, foi acionado e criou o Parque Estadual de Ilhabela, encerrando a palhaçada.


O que impede que algo parecido ocorra neste momento?

Prossigamos.

*

No dia 18 de janeiro escrevi:

Reconheçam a verdadeira vocação do arquipélago de Ilhabela e de seu entorno: era para ser um santuário, nada menos do que isso. Ainda dá tempo. (...) Como seriam as coisas se Ilhabela fosse para o Estado de São Paulo o que Fernando de Noronha é para o Brasil?

Em sua edição nº 258, do dia 2 de março último, o jornal Canal Aberto publicou o editorial «Santuário Ecológico Marinho, tão perto, tão nosso, tão longe. Possível?». Eis um trecho (grifo meu):

Com a falta de olhos sobre a questão [da proteção do patrimônio marinho de Ilhabela] por parte da Polícia Ambiental, da Capitania dos Portos, da Polícia Federal e da própria municipalidade, e, a persistir a ação devastadora e criminosa, vai chegar antes do que se espera o fim de toda a riqueza que povoa o espaço que bem poderia ser um Parque Ecológico Marinho, atrativo para o mundo.

Portanto, considerem lançada a idéia: Ilhabela, o Litoral Norte, o Estado de São Paulo e o Brasil precisam de um Santuário Ecológico Marinho no arquipélago de Ilhabela.

Naturalmente, a criação de um santuário nestes moldes deverá passar por uma série de estudos técnicos e legais, propostas formais devidamente embasadas e, claro, precisará contar com o apoio não apenas da população, mas também de pesquisadores, políticos, autoridades -- pessoas que, a exemplo do que ocorreu nos anos 70, realmente tornarão o parque marinho viável.

Quem se dispõe a reunir essas pessoas? Quem sabe exatamente o que é necessário para realizar essa idéia?

A questão aqui é deixar o discurso ambientalista-romântico em segundo plano, já que ele definitivamente não leva a nada. Não salvou Sete Quedas, não salvará o Litoral Norte. O discurso ambientalista-romântico torna o diálogo cada vez mais inviável pois ignora as necessidades reais das cidades do Litoral Norte e a possibilidade da região produzir algo que mereça ser preservado/vendido/divulgado/ensinado/transmitido para o restante de São Paulo, do Brasil e do mundo.

E até hoje o que nós produzimos que mereça ser preservado/vendido/divulgado/ensinado/transmitido? O que há aqui que não existe em nenhuma outra parte do Brasil e do mundo? Surpreende que poucas pessoas tenham feito tais perguntas até agora. Surpreende mais ainda que poucas pessoas tenham tentado levar as discussões nesta direção.

Acredito sinceramente que a criação de um Santuário Marinho Ecológico seja o melhor meio de, ao mesmo tempo, encerrar as propostas malucas de ampliar o porto e construir uma rodovia e de garantir que tais idéias sejam definitivamente arquivadas.

O Santuário Marinho Ecológico seria também a melhor forma de estabelecer definitiva e oficialmente um lugar para Ilhabela no Brasil e no mundo. Como sabemos, «Capital da Vela» é slogan, não uma condição oficial. É discurso para vender e utilizar um lugar, não para preservá-lo. A criação do Santuário Marinho Ecológico de Ilhabela seria o ponto final de todos os discursos e ações desenvolvimentistas no arquipélago e em boa parte do Litoral Norte.

Quem topa?

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