quarta-feira, junho 01, 2005

Socos e pontapés

Embora um pouco extemporâneo (porque a poeira da cassação do prefeito de Ilhabela já baixou um pouco), considero este texto bom demais para ficar guardado em minha caixa de e-mails. Ao autor, agradeço a autorização para publicação neste blog.

Socos e pontapés
Lucio Minardi

Li num dos pasquins ilhabelenses a notícia de que um opositor de Manoel Marcos foi agredido durante a passeata de apoio ao prefeito. O fato impressiona mas não surpreende. Política, já faz um tempo, tornou-se assunto pra ser resolvido a socos e pontapés, como se estivéssemos falando de times de futebol. A sucessão de fatos que agitou a vida política do município teve apenas um resultado positivo: fez o ilhabelense mostrar toda sua ignorância. Não estou falando de passeatas ou carreatas, de manifestações superficiais de apoio ou repúdio ao prefeito, mas de ações desse tipo serem realizadas sem o mínimo apoio do conhecimento e da lógica.

Pergunte a qualquer pessoa suas razões para ser contra ou a favor do prefeito. Ninguém conseguirá falar de outra coisa além das razões pessoais: gosto dele, ele é um bom prefeito; não gosto dele, ele é um mau prefeito. As pessoas dizem essas frases como quem amaldiçoa o técnico do Corinthians ou abençoa aqueles que o demitiram recentemente. Não importa que essas frases estejam certas, importa que elas reproduzam aquilo que a maioria das pessoas sente. Se a maioria tem a sensação de que o prefeito é bom, manifestar-se contra a sensação da maioria é correr o risco de ser agredido, como acabou acontecendo para o infeliz jornalista. E nisso a força dos argumentos não resiste à força de socos e pontapés.

Anos atrás presenciei uma manifestação pública na frente da Igreja Matriz pedindo um processo de impeachment contra a então prefeita Nilce Signorini. Naquela época, como hoje, frases lógicas deram lugar às palavras de ordem, bem ao estilo "Fora Collor" ou "Fora FHC". Nenhuma novidade pra quem já se acostumou à "inteligência ilhabelense".

Carreatas, passeatas e agressões são um balde de água fria naqueles que têm alguma esperança de encontrar vida inteligente no arquipélago. A inteligência de uma pessoa ou de um grupo de pessoas pode ser medida pela forma como elas tratam seus adversários. Conforme este critério, Ilhabela é a cidade mais burra do mundo, pois aqui assuntos políticos são reduzidos a brigas pessoais, desta pessoa contra aquela. Por exemplo, o processo de cassação foi reduzido a um duelo entre a pessoa que entrou com a ação no Ministério Público e o prefeito. Outro exemplo, a questão dos lotes do Siriúba virou queda de braço entre o prefeito e o técnico Renato Herrera, do DEPRN. Nos dois casos, o que era uma questão de justiça eleitoral ou de proteção ao meio ambiente passa a ser uma briguinha qualquer, onde quem tem a gangue maior mais chora menos.

A suspensão da cassação do prefeito, comemorada às pressas em clima de vitória e de forte emoção, sinaliza um rodízio de pizza mais adiante. No que diz respeito à política e à justiça, é bem possível que tudo dê em nada; bem ou mal, tudo continuará como está. Mas Ilhabela será diferente pra algumas pessoas. Quem foi acusado e inocentado, sairá fortalecido; quem acusou e teve seu processo encerrado sem conseqüências maiores, será condenado ao limbo. Isolados pelo contra-argumento da "perseguição política", aqueles que ousaram duvidar do prefeito correm o risco de experimentar perseguição pior que aquela supostamente sofrida pelo prefeito. Ninguém duvida disso, mas ao mesmo tempo não sabe explicar por que, a não ser por "sentir que vai ser assim". E já não faz diferença o que o prefeito, seus acusadores e seus defensores poderão dizer daqui pra diante. O povo já escolheu um lado, mesmo que o seu forte não seja procurar a verdade e raciocinar.

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