domingo, outubro 21, 2012

Resumo de três décadas

Foto de Vanessa de Paula, via G1.

Caiçaras venderam terrenos para turistas-veranistas-investidores da Grande São Paulo a preço de banana. Estes construíram casas de veraneio, pousadas e todo tipo de imóvel com o objetivo de criar aqui uma espécie de «campus avançado» das benesses metropolitanas. Claro que precisaram de mão de obra para isso. Caiçaras não querem, não sabem e/ou não precisam trabalhar em construção civil. Vieram os migrantes, do norte de Minas Gerais e do sul da Bahia. Somados os turistas-veranistas-investidores com os migrantes, a população de Ilhabela rapidamente ultrapassou a marca dos 20 mil habitantes -- dizem que a marca dos 30 mil também já ficou para trás.

Para onde foram os caiçaras? Ninguém sabe. Eles reaparecem esporadicamente, como marionetes na congada anual ou como sombras numa missa num domingo qualquer. Não se manifestam. O silêncio sugere consentimento, arrependimento ou medo -- ou todas estas coisas juntas.

Com a cidade crescida, com estrangeiros como maioria, com caiçaras fora de cena, é claro que os parâmetros só poderiam ser estrangeiros também. Tem-se usado aqui um padrão feito de asfalto e luzes, cujo futuro pode ser visto em várias versões em cidades tão diferentes como Caraguatatuba, São Paulo ou São José dos Campos.

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Há um conflito óbvio entre um lugar e um modelo de cidade. O lugar é o arquipélago de Ilhabela. O modelo é São Paulo, que é na verdade um antimodelo, um antiurbanismo, um antilugar -- é a expressão de um projeto de poder, não a tradução urbana daquilo que o lugar sempre foi. Desde a década de 80 inexiste a possibilidade de conciliar o modelo com o lugar e os esforços para combinar as duas coisas só tem levado à danação de um desses dois entes. E é basicamente por isso que Ilhabela, como a grossa maioria das cidades do litoral brasileiro, é uma cidade fuleira e cada vez mais medíocre instalada num lugar exuberante e único. Tornar-se cada vez mais medíocre, claro, implica tornar-se cada vez mais ignorante para com a exuberância e as particularidades deste lugar.

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A cada quatro anos as eleições municipais deixam claras duas coisas:

-- Candidatos, funcionários públicos (políticos ou não) e eleitores de um modo geral sequer imaginam tudo o que foi dito até aqui. Suspeitam que «algo errado» vem acontecendo nas últimas décadas, mas acreditam que a Prefeitura e a Câmara Municipal darão um jeito.

-- Por não terem conhecimento ou interesse acerca da história recente de Ilhabela, são incapazes de compreender o que está acontecendo. Isto leva essas pessoas a desenvolver projetos de poder e de investimento, não projetos de cidade, muito menos projetos de sociedade ou de cultura. Assim, obras e mais obras são propostas com a estúpida esperança (ou nem isso) de que possam constituir um projeto de cidade, de sociedade e de cultura, como se uma pavimento novo numa rua ensinasse algo ou nos ajudasse a valorizar o que nos foi dado sem nenhum esforço. É o OBRISMO em sua expressão máxima: a tendência -- que não é exclusiva de Ilhabela, claro -- de resolver todos os assuntos municipais, sejam eles estruturais ou não, à base de obras, reformas, inaugurações e fotos, porque currículo político é isso aí.

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Reparem que nossos patrimônios históricos foram reduzidos a três obras: a Igreja Matriz, a Cadeia Antiga e a Fazenda do Engenho d'Água. Praias, que aqui existem desde a pré-história e que foram o palco da pré-urbanidade ilhabelense, não apenas não são vistas como patrimônios como rapidamente foram transformadas em área de despejo de esgoto de casas e de barcos. Quem pode, tem piscina no quintal. Uma vez finalizada, a «maior obra de saneamento da história de Ilhabela» lançará esgoto praticamente in natura no meio do Canal de São Sebastião -- o que na prática significa que dependeremos da gentileza das correntes marítimas para não nadar em toletes e não ganhar inteiramente grátis uma micose e outras doenças mais desagradáveis.

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A Ponta do Pequeá já era. As praias já eram. As cachoeiras já eram. A cultura caiçara já era. A tranqüilidade, que atraiu um monte de gente de saco cheio da zoeira metropolitana, já era. A segurança já era.

Em troca ganhamos (a cacofonia foi de propósito) uma «fonte interativa», asfalto, avenidas mais largas, obras, obras e obras. Ainda vamos ganhar, em resposta aos apelos populares, um teleférico e uma ponte estaiada -- dois itens de extrema importância para o desenvolvimento econômico e cultural da sociedade ilhabelense.

Não surpreende que a Prefeitura de Ilhabela tem sido, como em tantas pequenas cidades brasileiras, a maior e mais importante empresa local. E o mais aterrorizante é que, a cada eleição, cidadãos continuam eufóricos com os projetos de poder de um político ou de uma coligação, continuam vendo a política como solução (não como o problema que sempre foi) e continuam subscrevendo ações (leis, decretos, projetos) que nada trazem além de uma dependência cada vez maior da população em relação ao poder público municipal.

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Mudam-se prefeitos e vereadores e uma coisa não muda: Ilhabela continua trocando o que tem de mais particular, único e especial por coisas absolutamente medíocres, banais e comuns.

E as próximas três décadas?

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Nota:

Eu seria muito injusto se, em meio a um manifesto desses, não destacasse o trabalho de duas instituições: o Instituto Ilhabela Sustentável e o Observatório Social.

Estas duas organizações têm realizado ações fundamentais para o município e mostram estar atentas a fatos como os que mencionei em meu texto. É uma pena que boa parte das energias dessas organizações seja consumida na tarefa de moderar o frenesi desenvolvimentista da Prefeitura e da Câmara Municipal.

sexta-feira, agosto 31, 2012

Para quê serve Ilhabela?


Pois bem. Você viu o prefácio, não? Se não viu, vá lá, veja antes de ler as linhas seguintes.

O próximo passo é lembrar das razões que trouxeram você para este lugar.

Mesmo que você seja, suponhamos, o mais mau-caráter dos especuladores imobiliários de Ilhabela, você só será 100% mau-caráter se você não mora no arquipélago. Se você mora aqui então

1) você reconhece o valor que este lugar tem e
2) espera que este lugar continue o acolhendo como o acolheu desde o início.

Se, além de morar, você também está criando seus filhos aqui, então você não é tão mau-caráter assim: talvez lhe falte ascendência, mas você já possui uma descendência para a qual você planeja uma vida boa no lugar em que você vive neste momento. A bem dizer, você não é exatamente mau-caráter, você tem esperança e conta com a gentileza deste lugar. Isto vale para todas as outras pessoas que moram aqui -- não importa a dose de mau-caratismo que as constitua.

Resumindo: quem mora aqui, em alguma medida tem uma relação de amor com este lugar:

-- no passado, porque escolheu viver aqui ou porque, caso tenha nascido aqui por algum acidente do destino, seus ascendentes fizeram essa escolha.

-- no presente, porque de outra forma já teria feito as malas para subir a serra.

-- no futuro, porque, como indiquei acima, tem a esperança de terminar seus dias aqui no arquipélago e ser enterrado pelos bisnetos, também moradores de Ilhabela.

Se assim é -- e acho difícil que seja de outra forma -- por que raios tantas e tantas pessoas comportam-se como se a necessidade mais urgente de Ilhabela fosse transformar o arquipélago numa cópia malfeita e em escala reduzida de alguma cidade da Grande São Paulo? Por que raios tantas e tantas pessoas trabalham como se aquilo que as liga a este lugar -- ontem, hoje e amanhã -- fosse mero acidente, absolutamente desnecessário para a sobrevivência delas próprias, como se esse elemento de conexão entre as pessoas e o lugar não fosse o fator decisivo para a preservação do lugar mas também -- e principalmente -- para essa sobrevivência?

Entendo que há em Ilhabela um número significativo de pessoas que vieram para o arquipélago exclusivamente para trabalhar. Algumas dessas pessoas estão aqui por razões circunstanciais, isto é, ficam aqui enquanto houver renda e trabalho. Comportam-se como parasitas. Trabalham como se uma vida boa dependesse apenas do dinheiro no bolso. São sanguessugas, não são gente, muito menos cidadãos.

O que não se pode ignorar, porém, é que estas pessoas só conseguem trabalho e algum êxito financeiro e profissional porque há pessoas sinceramente dispostas a criar raízes aqui.

Um marceneiro que trabalha contando os dias que faltam para completar o montante de dinheiro que o levará de volta à sua terra natal, presta serviços a quem precisa de armários e prateleiras em um lar (o negrito não foi à toa) situado em algum bairro de Ilhabela.

O construtor que realiza obras sonhando com o próximo serviço em qualquer outra cidade do litoral presta serviços a quem decidiu ter uma casa para morar em Ilhabela -- algo que, por definição, só deixará o arquipélago após a demolição e que, portanto, implica uma dose razoável de raízes.

Tais exemplos são suficientes para compreender que até mesmo o mais mesquinho e ganancioso dos indivíduos depende da bondade deste lugar e, sobretudo, depende da existência de um bom número de pessoas dispostas a reconhecer essa bondade e abraçá-la verdadeiramente.

Portanto, não seja imbecil. Se obras fossem algo bom em absoluto, já teríamos pontes ligando o arquipélago ao continente, edifícios de 30 pavimentos e uma larga avenida com pedágios contornando toda a Ilha de São Sebastião. O que é bom é ação realizada com critério e critério só surge quando as pessoas estudam e observam com atenção a realidade que se pretende modificar. Compreender essa realidade inclui compreender os fatores que o trouxeram para Ilhabela e que fazem você continuar aqui. Se você apóia ações, projetos, políticas e idéias que pretendem modificar substancialmente esses fatores, isto é o mesmo que dar um tiro no próprio pé ou serrar o galho em que você está sentado. 

Não se comporte como se o patrimônio natural e histórico que existe sob seus pés fosse permanente e circunstancial, como se ele pudesse ser transformado e remodelado e maquiado sem que sua própria vida não se alterasse em nada.

Experimente apagar uma memória, abandonar um hábito ou alterar substancialmente um cenário do dia-a-dia e veja o que acontece em sua vida.

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A resposta à pergunta proposta no início é: Ilhabela serve para ser o que sempre foi antes mesmo que houvesse uma cidade aqui. Não digo isso porque este é o meu sonho cor-de-rosa, porque eu quero que seja assim, mas porque, como espero ter demonstrado, é exatamente isso que traz as pessoas para cá -- moradores, veranistas e turistas.

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link da imagem

terça-feira, agosto 28, 2012

Para quê serve Ilhabela? -- um prefácio visual


Ilhabela serve para isto


 E isto


E isto


E isto


E mais isto


E para isto também, claro 


Calma, ainda não acabei... Ilhabela também serve para isto


E isto


Para isto


Para isto


E isto 


(Clicando nas imagens é possível vê-las ampliadas)

Voltarei ao tema em breve. Mas acho que já deu pra sacar o recado, não? Ou você achou que a resposta à pergunta do título tinha algo a ver com asfalto e alargamento de ruas, obras públicas e reformas urbanas, ampliações de portos, planos de governo, planos de gestão, audiências públicas, cargos políticos e idéias geniais? 

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«Simplifique, simplifique» -- Henry Thoreau.

domingo, agosto 26, 2012

Nove pessoas que eu gostaria de ver na Câmara Municipal


Nas próximas eleições escolheremos os nove vereadores que ajudarão a decidir o destino de Ilhabela a partir de 2013. Eis nove pessoas que eu gostaria de ver cumprindo essa tarefa.

Os nomes foram apresentados em ordem alfabética (com exceção dos três últimos, agrupados no mesmo item), conforme o «nome para urna», selecionados conforme critérios que explicarei a seguir.

A lista com todos os candidatos pode ser encontrada aqui.

Se você chegou aqui buscando informações para escolher um candidato, sugiro também que leia isto (via Facebook), para que seu voto não termine por eleger um «candidato tiririca».

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1) Prof. Adriano Leite (23.577, PPS)

Prof. Adriano é professor da rede pública de ensino há muitos anos -- pelo que sei, quase sempre atuou em alguma das diversas comunidades isoladas do arquipélago, desenvolvendo um trabalho interessante de pesquisa, ensino e perpetuação das tradições caiçaras. Sabe o que é cultura e qual sua importância para a população de Ilhabela. E certamente sabe da importância que a cultura -- tradicional ou não -- tem na vida política.

2) Djane (70007, PTdoB)

Djane já foi secretária municipal de turismo. Estudada, inteligente e esclarecida. Tem experiência inclusive em assuntos públicos e já mostrou -- dentro e fora das redes sociais -- que tem princípios e que realmente sabe usá-los.

3) Luizinho da Ilha (65065, PCdoB)

Chegou a ocupar uma das cadeiras da Câmara por uma sessão em Abril deste ano. Na sua única sessão defendeu o uso das bicicletas no município. A solução era tosca (postos de locação de bicicletas), mas a causa é obviamente boa. Escolheu um dos piores partidos para se candidatar, mas tem se mostrado um sujeito com a cabeça no lugar, que muito pode contribuir para o município. Espero sinceramente que seja eleito e mude logo de partido.

4) Marcelo Bartatas (25025, DEM)

Marcelo é empresário, casado, pai de dois filhos. Sempre envolvido nas questões mais importantes do município, tem desenvolvido um bom trabalho junto à Associação Comercial. Algumas de suas boas idéias podem ser vistas aqui. Ilhabela precisa de gente que pensa.

5) Sampaio (70181, PTdoB)

Cidadão esclarecido e engajado, que há tempos acompanha o desenrolar da política em Ilhabela. Comerciante em Ilhabela, conhece bem a dureza da sazonalidade do litoral paulista.

6) Teo (70706, PTdoB)

O sr. Teo aparece neste vídeo, em ocasião da inauguração do acesso à Praia do Julião.

Sempre achei que a questão da mobilidade e da acessibilidade não são resolvidas porque não são compreendidas e que não são compreendidas basicamente porque a maioria dos políticos não depende de uma cadeira de rodas para se deslocar e não usa o transporte público ou a bicicleta para as atividades do dia-a-dia.

Sempre achei também que uma cidade bem resolvida é uma cidade que funciona bem para crianças, idosos e deficientes (portadores de necessidades especiais). Em seus últimos anos de vida, meu avô se queixava -- com total razão, aliás -- da péssima qualidade das calçadas de Ilhabela: mesmo um idoso saudável não consegue caminhar 1km até a Vila sem se deparar com algum obstáculo importante.

Por isso, acredito que o sr. Teo fará diferença na Câmara.

7, 8 e 9) Genu (11606, PP), Zuleide (40333, PSB) e Hélio do Bonete (33234, PMN)

Recomendo estas três pessoas pelo mesmo motivo: gente que, apesar da origem simples, mantém os dois pés na realidade do dia-a-dia, sabe o que é viver em Ilhabela e sabe o que realmente importa, para além das politicagens.

Acredito que estas três pessoas serão o contrapeso do tecnicismo que às vezes passa dos limites nos trâmites dos assuntos públicos e que com freqüência leva ao desenvolvimentismo.

O sr. Hélio, em especial, certamente sabe dos riscos que o Bonete e outras comunidades isoladas correm com o crescimento da cidade e do Litoral Norte e, como vereador, saberá tomar decisões com o objetivo de manter a qualidade daquela pequena jóia da costa sul.

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Algumas observações:

1) Não sugeri ninguém que já tenha sido vereador. Nada tenho contra os atuais vereadores -- inclusive porque desconheço a maioria --, apenas acho que um mandato de quatro anos precisa ser suficiente para o desenvolvimento de um bom trabalho. Não há nada que justifique manter o mesmo vereador por mais de um mandato na Câmara, inclusive como forma do indivíduo não tomar o cargo como emprego -- sem falar na importância de prevenir o surgimento de «políticos profissionais». Ademais, diversificar pessoas e pontos de vista é importante.

2) Considero fundamental compor uma Câmara heterogênea, que inclua desde pessoas simples, «do povo», até empresários, comerciantes, especialistas com boa formação. Diferentes faixas etárias também ajudam.

3) Não conheço pessoalmente todas as pessoas que recomendei aqui. Por isso, algumas recomendações se baseiam em suposições. É possível que estas recomendações mudem. Se as pessoas que recomendei aqui quiserem se manifestar, serão muito bem-vindas.

4) Naturalmente, numa eleição com mais de uma centena de candidatos à Câmara, há mais do que nove pessoas decentes e em condições de atuar no Legislativo. Quem não apareceu nesta lista, por favor não se sinta ofendido ou diminuído. Ao invés, sinta-se à vontade para se manifestar também. Também serão bem-vindos.

5) Candidaturas como a do sr. Teo parecem se basear em uma especialidade, mas espero que não seja. Realmente não me atraem candidatos que tentam se eleger com base em um tema: o candidato da mobilidade, o candidato dos aposentados, o candidatos dos animais de rua etc. Estes temas são todos importantes, claro, mas um vereador precisa ter visão ampla e critérios para saber o que fazer diante de assuntos diversos. Se não for assim, votará conforme as recomendações dos assessores e técnicos da Câmara. Como mencionei antes, não se trata de eleger pensadores (embora isso possa ser bom), mas de eleger pessoas que sabem colocar os assuntos maiores à frente de assuntos menores e que sabem -- o que é mais importante -- avaliar os assuntos menores à luz dos maiores. Por exemplo, a questão da acessibilidade nada mais é do que uma questão de dignidade humana, que não se expressa apenas na construção de rampas e calçadas rebaixadas.

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sábado, julho 21, 2012

Curso de Yoga em Ilhabela


A partir de Agosto, o Templo do Yoga oferecerá o primeiro curso de yoga tradicional de Ilhabela. O curso tem o apoio da Natha Sampradaya, a ordem indiana dos criadores do Hatha Yoga. Mais informações no site do Templo do Yoga.

segunda-feira, abril 16, 2012

O que queremos?


Trocamos o que temos, que é essencial e que só existe neste arquipélago por coisas de que não precisamos e que podem ser encontradas em qualquer parte. Hoje, por exemplo, valoriza-se mais uma piscina do que a qualidade das águas do Canal de São Sebastião.

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A vocação de todos nós, moradores de Ilhabela, é sermos admirados pelos moradores das grandes cidades por nossos modos de vida intimamente ligados às condições e aos ritmos naturais do arquipélago. Desde a travessia marítima somos convidados a viver em outra velocidade.

Nas últimas décadas, não apenas temos ignorado esta vocação como também temos admirado e copiado modelos, princípios e valores que só servem aos moradores das grandes cidades. Reproduzimos estes modelos no arquipélago, orgulhosos de uma aparente «modernidade», e depois nos surpreendemos quando estes modelos, princípios e valores resultam nos mesmos problemas observados nas grandes cidades.

Resumindo: se você vive em Ilhabela, viva para Ilhabela. E se você não sabe o que é Ilhabela, comece a olhar ao redor.

domingo, março 04, 2012

Santuário Ecológico Marinho de Ilhabela JÁ


Acompanhei a manifestação realizada ontem na Vila pela sociedade civil contra a ampliação do porto de São Sebastião. Entendo os elementos emocionais que levam à realização de tais ações, mas, na melhor das hipóteses, coisas assim são muito ingênuas. Digo isso por dois motivos.

O primeiro é o fato de que manifestações públicas por definição não propõem nada. E a manifestação de ontem não foi diferente; seu resumo é «não queremos o porto, o porto é mau». Essa foi a «mensagem» transmitida, em nada diferente do que já vem sendo dito há muito tempo inclusive por pessoas mais esclarecidas e mais dispostas a buscar e a transmitir informações consistentes.

O segundo é o fato de que quem precisava receber a mensagem dificilmente se abalará com um punhado de crianças e adolescentes obviamente bem intencionados gritando palavras de ordem repetidas ad nauseam em redes sociais. Desde o Fora Collor, políticos e burocratas estão absolutamente acostumados a lidar com manifestações públicas. É compreensível que pessoas em idade escolar se disponham a isso, mas não é compreensível que até hoje não tenha surgido uma idéia, uma estratégia, um caminho que realmente indique que há alguma possibilidade real de que o governo desista das suas birutices.

Mas eis que surge uma idéia.


sábado, março 03, 2012

Notas sobre ampliação do porto de São Sebastião II



Neste sábado, 3 de março de 2012, a sociedade civil de Ilhabela deverá fazer uma manifestação contra o projeto de ampliação do porto de São Sebastião. Oportunista que sou, permitam-me aproveitar o momento para oferecer novamente meus cinco centavos sobre o assunto.

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Dezembro passado escrevi algumas coisas sobre o assunto e ao final do texto concluí que o melhor é evitar não apenas o projeto de ampliação do porto, mas qualquer ação que implique mais «desenvolvimento regional» para o Litoral Norte. Coloco aspas em «desenvolvimento regional» porque quando se fala disto notamos desenvolvimento para setores específicos do Estado de São Paulo como um todo (indústrias, por exemplo) e um pesadíssimo ônus social e ambiental para a região que recebeu o magnífico empreendimento. Cubatão é um exemplo clássico dessa palhaçada estatal travestida de conto de fadas.

Não apenas em razão de exemplos trágicos como o de Cubatão, todos sabemos aonde o «desenvolvimento regional» leva e sabemos também que mesmo o melhor cenário futuro não será tão bom quanto o cenário atual e será infinitamente pior do que o cenário de 30 ou 40 anos atrás. Em outras palavras, o Litoral Norte está piorando e uma das propostas do Governo do Estado de São Paulo é acelerar este processo através da realização de obras que obviamente intensificam os fatores de degeneração social e ambiental. Genial.

Só que...

quarta-feira, janeiro 18, 2012

Pelo fim do TEBAR

Era para ser um santuário...

O Terminal Marítimo Almirante Barroso já deu o que tinha que dar. Além das novas tecnologias de extração e transporte de petróleo, o mundo cada vez mais se volta às fontes de energia renováveis.

Já passou da hora de desativar essa porcaria. Transformem o extenso atracadouro de petroleiros num píer para pescadores e para turistas. Libertem o Canal de São Sebastião da dança macabra de petroleiros e rebocadores e do risco constante de acidentes terríveis, como derramamentos de petróleo e coisas ainda piores.

Desativem e desmontem os tanques no centro da cidade de São Sebastião. Aquela área gigantesca serviria muito bem como centro turístico, como extensão do Parque Estadual da Serra do Mar, que a duras custas resiste à expansão urbana.

Reconheçam a verdadeira vocação do arquipélago de Ilhabela e de seu entorno: era para ser um santuário, nada menos do que isso.

Ainda dá tempo.

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Eu sei que a idéia é maluca e inexeqüível, mas me respondam:

1) Do que propus acima, o que pode ser feito?

2) O TEBAR é o reflexo de um país motorizado. O que seria necessário fazer para que uma proposta de desativação do TEBAR não pareça maluca?

3) Como seriam as coisas se Ilhabela fosse para o Estado de São Paulo o que Fernando de Noronha é para o Brasil?

4) A minha idéia é mais maluca do que a da Companhia Docas?

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Considerem também o seguinte:

1) Se a Companhia Docas ignora a vocação desta região e propõe uma expansão de um tipo de infra-estrutura que já trouxe problemas suficientes, eu, como cidadão comum, tenho o direito de elaborar propostas também. Todo mundo tem esse direito.

2) A simples proposição de idéias não significa muita coisa, mas significa mais do que apenas indignar-se com as cagadas dos desenvolvimentistas. Se eles querem ser ouvidos, peço que me ouçam também e que ouçam todos os que tiverem outras idéias. Coloquem todas as idéias em discussão. Abram a discussão. Considerem, por um instante, que as comunidades caiçaras que viviam no lado continental de Ilhabela ainda têm tanto direito sobre este arquipélago quanto a Petrobrás, a Companhia Docas, a Prefeitura de Ilhabela e qualquer outra comunidade, instituição ou grupo.

3) A vocação de Ilhabela e do Litoral Norte de um modo geral não foi totalmente destruída. Recentemente muitas pessoas testemunharam a presença de baleias no Canal de São Sebastião. Ainda há pessoas que se admiram com isso e que vêem em fatos desse tipo TODA a razão de ser deste lugar. Realmente, ainda dá tempo de fazer algo para resgatar essa vocação.

segunda-feira, dezembro 12, 2011

Notas sobre a ampliação do porto de São Sebastião


Eis uma coleção de anotações sobre a discussão do mês no Litoral Norte.

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Toda semana vou a Caraguatatuba, onde comecei a trabalhar uns meses atrás. Sabe o que vejo por lá? Uma cidade em efervescência.

Na memória trago imagens de Caraguatatuba de mais de vinte anos atrás. Era um lugar decadente. Àquela época era difícil imaginar que essa cidade poderia tornar-se algo além de mera passagem rodoviária para as demais cidades do Litoral Norte. Decerto Caraguatatuba não tem as belezas naturais das cidades vizinhas, mas hoje tem algo que elas não têm: mais de 100 mil habitantes, que infelizmente precisam consumir, deslocar-se e habitar e que inevitavelmente produzem lixo e esgoto.

O desenvolvimento econômico tem um preço, é claro, e com ele qualquer lugar fica exposto à avalanche de problemas urbanos que todos nós já conhecemos. A essência do que se convencionou chamar de «desenvolvimento sustentado» está justamente na possibilidade de obter desenvolvimento social e econômico sem esgotar os fatores que impulsionaram e que mantêm esse desenvolvimento.

O que torna o desenvolvimento sustentável possível? Três coisas:

1) governo disposto a aplicar o dinheiro público no bem público
2) população que preze o patrimônio social e ambiental
3) cultura e educação, somatória que dá origem aos dois itens acima

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Quem é contra a ampliação do porto de São Sebastião está fazendo a lição de casa? Eu queria saber:
  1. Quantas dessas pessoas foram à audiência sobre a ampliação do porto a pé ou de bicicleta?
  2. Mesmo que não usem estes meios de transporte, quantas pessoas estão realmente dispostas a usá-los?
  3. Quantas dessas pessoas votaram (ou ainda votam) no PT e no PSDB e em seus aliados?  
  4. Quantas dessas pessoas chegam a fazer campanha para estes dois partidos e para seus aliados? 
  5. Quantas dessas pessoas têm mais de um aparelho de TV em casa? 
  6. Quantas dessas pessoas consomem mais do que precisam? 
  7. Quantas dessas pessoas se esforçam para reduzir o consumo e a produção de lixo? 
  8. Quantas dessas pessoas realmente sabem qual é o destino do lixo e do esgoto produzido em suas casas?
  9. Quantas dessas pessoas ainda acreditam no aquecimento global?
  10. Quantas dessas pessoas acreditam que é preferível entregar a Amazônia às ONGs estrangeiras a permitir que ela seja administrada (e, possivelmente, devastada) pelas mãos dos próprios brasileiros?
  11. O que essas pessoas têm a dizer sobre a evolução da condição ambiental de Ilhabela nos últimos 40 anos? Elas se banham nas praias do Perequê, do Saco da Capela e do Itaguassu? Se não, por que? Se sim, quantas micoses e otites nos últimos anos? Que tal a fragrância de esgoto?
(Aliás, eu sou do tempo em que era possível tomar banho de mar na Vila.)

quinta-feira, novembro 03, 2011

Morar em Ilhabela


Muitas pessoas têm me mandado emails pedindo informações sobre morar em Ilhabela. As perguntas vão desde as minhas impressões sobre este lugar até itens mais objetivos, como custo de vida e perspectivas de obtenção de trabalho.

Este post tem como objetivo reunir as informações que tenho transmitido a essas pessoas e acrescentar mais algumas que, acredito, podem ser úteis para quem pensa em morar em Ilhabela num futuro breve.

Por partes.

segunda-feira, julho 25, 2011

Anti-cidadania



A cidadania começa quando o indivíduo torna-se capaz de ver-se como alguém dotado de um mínimo de autonomia e de responsabilidade pelos próprios atos. Só depois disso é possível compreender os acontecimentos públicos e as idéias correntes, bem como o papel que o próprio indivíduo tem nisso tudo. Não há melhor definição de anti-cidadania do que a imagem do sujeito que se queixa do mau cheiro de um lugar sem perceber seus próprios dejetos espalhados no chão.

Trecho de meu artigo mais recente, publicado no site da TV Ilha.

Para ler na íntegra, clique aqui.

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sábado, maio 07, 2011

A verdade não está lá fora


«(...) são poucas as pessoas que se contentam com a riqueza das coisas simples. O conforto metropolitano faz falta para essas pessoas, que se incomodam com os pés sujos de areia ou de lama. Essas pessoas preferem burocracia, maquiagem, leis e um tipo de conforto que flerta com aparelhos de ar condicionado, guias turísticos ocos e palavras e ações oficiais. São gente que não gosta de gente. Gente que não gosta de lugar. Gente que constrói demais, que modifica demais, que derruba demais, que gasta demais e que vende demais. E que depois se queixa que Ilhabela já não é como antes. Essa gente merece passar as férias na Disney. Essa gente só quer souvernirs.»

Trecho do meu artigo mais recente. Leia na íntegra clicando aqui.

quarta-feira, abril 13, 2011

Cultura salva vidas


Meu artigo mais recente no jornal Canal Aberto.

Japão e Uganda têm lições valiosas a ensinar ao resto do mundo e demonstram, para quem ainda duvidava, que a cultura salva vidas. E o Brasil, o que tem a ensinar? Carnaval, samba, futebol? Não estamos falando de divertir e entorpecer pessoas com banalidades, mas de salvá-las. Mais do que tempo e recursos, perdem-se vidas enquanto escolas, universidades, oficinas e centros culturais, secretarias e ministérios seguem acreditando na idéia de que cultura é oba-oba e, no máximo, estofo intelectual. Enquanto o Brasil segue firme como o país da permissividade e ocupa o penúltimo lugar no desempenho escolar, leis de apoio à cultura patrocinam filmes sobre traficantes e prostitutas.

sexta-feira, março 18, 2011

Ciclista, esse incompreendido

Ontem na Câmara Municipal de Ilhabela houve a não-audiência acerca do projeto dos novos trechos da ciclovia do arquipélago. «Não-audiência» porque o Executivo municipal não compareceu e, portanto, ninguém viu o projeto para discuti-lo. O noticiário completo pode ser lido aqui.

Mesmo sem o projeto, sabe-se que a proposta da Prefeitura prevê novamente o uso da orla e a construção de uma ponte estaiada no mar, na Barra Velha. Sabe-se também que o custo será alto, sobretudo pelas dificuldades técnicas de implantar os novos trechos praticamente sobre o mar.

Algumas ponderações a respeito da ciclovia -- a atual e a que se pretende construir:

1) Ciclovia no mar não, por favor. Mar é pra peixe, pra turista, pra banhista, pra criança, pra nadar e tomar sol, pra diversão e lazer. Já é suficientemente preocupante o fato de boa parte da orla ilhabelense ter sido tomada por casas, muros, píers. Passar uma ciclovia não apenas não reverterá este quadro como tomará ainda mais espaço que originalmente devia servir pra peixe, pra turista, pra banhista...

2) Além da questão do espaço, há também o fato de que o mar se revolta às vezes. Mesmo que a nova ciclovia seja uma jóia da engenharia, ela não será suficiente para compensar a (in)cultura brasileira, fortemente inclinada a se lixar para a manutenção das vias públicas.

3) Não menos grostesca é a idéia de marginalizar ainda mais os ciclistas, como se gostássemos de pedalar por caminhos ermos, pouco iluminados e monitorados. Quanto mais afastada das vias públicas a ciclovia estiver, pior para todos, principalmente para os ciclistas.

Sobre este último item vale a pena estender-me com algumas explicações.

Ciclovia deve ser exceção, não a solução habitual para oferecer algum conforto para ciclistas. Além de custosa e difícil, a construção de uma ciclovia estabelece um território de uso exclusivo para ciclistas. A maioria dos ciclistas acredita que isto é bom, mas não é. A ciclovia é uma forma de oferecer conforto aos ciclistas, mas é também uma forma de excluí-lo do trânsito. Motoristas que não sabem lidar com a presença de pedestres e ciclistas no trânsito, continuarão não sabendo. Em outras palavras, uma ciclovia é uma excelente forma de dizer aos motoristas que eles continuam sendo os protagonistas do trânsito.

No Japão, um dos países em que a bicicleta é meio de transporte comum e seu uso é generalizado, raramente se vêem ciclovias. O que se vêem são calçadas largas nas avenidas e pedestres e ciclistas as compartilham, sem incidentes. O ciclista é livre para usar a avenida, desde que use capacete. Ruas menores não possuem calçadas, muito menos ciclovias: pedestres, ciclistas e automóveis dividem o mesmo asfalto, que no máximo recebe uma faixa indicando a porção mais adequada para os pedestres.

Pode-se dizer que lá é assim porque o povo japonês é educado. Surge aí o famoso dilema de Tostines: eu realmente não sei se o trânsito de bicicletas pode ser assim no Japão porque lá as pessoas são educadas ou se as pessoas são educadas porque foram expostas a situações em que a sobrevivência e o convívio nas áreas públicas dependia de um mínimo de educação. No caso de Ilhabela, diante de um dilema desses, opta-se pela segregação pura e simples. A visão ilhabelense é de que o ciclista é e deve continuar sendo um marginal mesmo. Dilema resolvido.

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A propósito da marginalidade inata do ciclista, vejam que belezura o folheto que foi distribuído à entrada do plenário da Câmara Municipal de Ilhabela (sem identificação da autoria), na noite da não-audiência:



As idéias defendidas são razoáveis. De fato, ciclovia na orla será uma barca furada (talvez, literalmente). No entanto, as ilustrações insinuam que o ciclista é a causa dos problemas citados, enquanto que a realidade é um pouco diferente.

Imagem 1 -- Riscos de acidentes
De fato, quando a ciclovia é construída entre a calçada e a praia, os riscos de acidentes existem, como já indiquei várias vezes neste blog. Uns anos atrás a Prefeitura caiu na besteira de construir uma ciclovia desse tipo, ignorando esses riscos. Felizmente os acidentes envolvendo pedestres e ciclistas são raros, mas o risco permanece e pedestres continuam caminhando na ciclovia. Não há fiscalização, não há orientação, tampouco sinalização decente. A imagem do ciclista pedalando displicentemente, olhando para a moça de biquini não corresponde à realidade da maioria dos ciclistas, que também são vítimas de uma ciclovia pessimamente projetada. Uma ciclovia ruim e constantemente ocupada por pedestres obriga o ciclista a ficar mais atento (o que, obviamente, não é um argumento a favor de que se construam mais ciclovias ruins).

Imagem 2 -- Impacto ambiental e paisagístico
Por que diabos uma propriedade precisaria separar-se de uma ciclovia com alambrado, arame farpado e cão de guarda? Nada a favor de que se construa a ciclovia sobre a areia da praia, mas mais uma vez o ciclista é representado como o vilão, o inconveniente, o segregável. De qual mundo de sonhos veio essa imagem?

Imagem 3 -- Riscos de mortes e outros crimes
Alguém aí sabe o número de ocorrências criminais ocorridas na ciclovia atual? Será este número maior do que o número de ocorrências que ocorre nas ruas e calçadas de Ilhabela? Ou, talvez, o número de bicicletas roubadas e furtadas fora da ciclovia? «Prováveis» é um termo que demonstra descompromisso com a realidade; recorre-se às probabilidades somente quando não há dados suficientes -- alguém os procurou antes de compor esse panfleto? Ademais, na ilustração, o sujeito à direita é um ciclista-assaltante?!? Porca miséria.

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Perguntas necessárias, mas que, creio eu, permanecerão sem resposta:

1) Quantos ciclistas foram ouvidos para compor esse panfleto?
2) E para compor o projeto da nova ciclovia?
3) Quantos funcionários da Secretaria de Obras usam a bicicleta como principal meio de transporte?

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Leiam também:
Ciclovias são realmente necessárias?
Não use a ciclovia
Ciclistas Urbanos de Ilhabela

domingo, fevereiro 27, 2011

Pelo menos diga não


Uns anos atrás decidi iniciar um negócio. Pretendia oferecer um determinado serviço que, até onde eu podia compreendê-lo, seria de grande interesse para hotéis e pousadas de Ilhabela. Elaborei um material impresso e tirei um dia para ir de porta em porta apresentar o serviço. Em alguns lugares conversei com os proprietários. Em outros, conversei com gerentes ou recepcionistas. Em todos os lugares deixei um folheto que explicava a proposta -- que, aliás, não envolvia nenhum custo para o hotel ou pousada.

Na maioria dos casos fui bem recebido. As pessoas que me atenderam pareciam sinceramente interessadas no que eu lhes mostrava. Encerrei o dia confiante de que seguia na direção correta.

Passaram-se duas, três semanas. Não tive nenhuma resposta. Decidi fazer novo contato, desta vez por email, repetindo algumas explicações transmitidas no contato inicial e pedindo resposta. Fiz isso da forma mais pessoal possível, escrevendo mensagens direcionadas especificamente às pessoas com quem falei. Mala direta não costuma ter alça, por isso a evito.

Mais uma semana de espera e nenhuma resposta.

Depois disso desisti e passei a rever meu planejamento e a desenvolver outras estratégias, que felizmente se mostraram menos ineficazes do que bater de porta em porta e apresentar minha proposta às pessoas responsáveis pelos hotéis e pousadas desta cidade. Eu realmente não fiquei chateado por não ter tido o êxito que gostaria naquela ocasião. O que realmente me chateou foi não ter tido nenhuma resposta -- positiva ou negativa.

É óbvio que nenhuma das pessoas contatadas teve o menor interesse no que propus, mas suas atitudes não correspondiam a esse fato. Como assinalei acima, algumas pessoas se mostraram interessadas; outras, embora não mostrassem tanto entusiasmo, se dispuseram a avaliar a proposta com atenção. Mas não recebi nenhum resposta, nenhum «não, obrigado», nem durante, nem depois.

Sou levado a crer que Ilhabela padece de uma doença que não é típica daqui, mas que aqui encontrou condições ideais para se tornar epidêmica: a dificuldade para ser sincero, que em muitos casos manifesta-se como dificuldade para dizer um simples «não». Noto, por exemplo, que muitas pessoas vêem o «não» como símbolo universal de antipatia e por isso o evitam, mesmo que para isso seja necessário mentir. Quando os assuntos são simples, é raro ter certeza absoluta de que uma pessoa mentiu. Então, se não existe um compromisso direto, a maioria das pessoas prefere mentir a dizer um «não» sonoro e cristalino.

Não sei se fazem isso apenas para manter uma atitude simpática, mesmo que o preço disso seja a verdade. Receio que haja algo mais profundo nessa atitude. O «não» sonoro e cristalino é a certeza necessária para que a pessoa que o recebe faça outra coisa, mude a estratégia, aperfeiçoe o produto ou o serviço. No meu caso, perdi tempo precioso e gastei energia alimentando expectativas que não foram correspondidas. Se a idéia é manter a pessoa em expectativas desse tipo, não é difícil ver nisso intenções malignas de eliminar personagens de um mercado excessivamente competitivo. Mas, é claro, tudo isso pode ser apenas pulga atrás de minha orelha. Ou não.

sexta-feira, fevereiro 25, 2011

Para onde vamos?



Artigo publicado no jornal canalABERTO em 24 de fevereiro de 2011. Para ler na íntegra, clique aqui.

A democracia colocou a ignorância e a estupidez no poder; crimes passaram a ser tolerados; vítimas passaram a ser responsabilizadas pelos atos de seus detratores, que passaram a ser perdoados como vítimas do «sistema»; a história deste país fez as expectativas despencarem. Na escala reduzida de uma cidade como Ilhabela, isto significa aceitar com complacência e até certa alegria o fato de que líderes políticos, intelectuais e empresariais — pessoas teoricamente imbuídas da responsabilidade de conduzir a cidade na melhor direção — demonstram não ter a mais mínima idéia do que acontecerá nos próximos 10 ou 20 anos. É surpreendente que aceitemos ser conduzidos por tais pessoas, que lhes atribuamos alguma autoridade e que, ao mesmo tempo, as dispensemos de responder perguntas tão simples como «para onde vamos?». Isto se torna ainda mais surpreendente quando lembramos que a resposta a esta pergunta já está dada: estamos seguindo fielmente a linha que foi traçada nas últimas quatro décadas.

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

Uma leitura crítica do manifesto do IIS

O manifesto do Instituto Ilhabela Sustentável é longo e merece ser lido e analisado com atenção. O texto integral do manifesto pode ser lido aqui. Nesta análise eu o reproduzirei por partes, devidamente destacadas em negrito.

sábado, fevereiro 05, 2011

Notas recentes

-- No trecho entre a Vila e o Saco da Capela, a ciclovia continua não funcionando para ciclistas em «dia de navio». E os turistas continuam não sabendo que ali não é calçada. Prefeitura Municipal parece estar esperando um acidente acontecer para tomar providências.

-- O trecho novo da ciclovia, na Barra Velha, já foi invadido por pedestres -- a exemplo do que ocorre no trecho citado anteriormente. Ademais, o novo trecho é ruim, por diversos motivos. Eu, pessoalmente, prefiro e vou pedalar no asfalto.

-- Nesta semana o asfalto da Barra Velha mostrou a que veio: gerar enchentes. Eu achei que nenhum engenheiro caía mais na pegadinha da impermeabilização do solo em cidades sujeitas a chuvas fortes. Parece piada: enchente numa ilha.

-- Mesas e cadeiras em toda a parte, nas calçadas da Vila e nas praias de todo o arquipélago. Nada contra, desde que os bares, quiosques e restaurantes estejam pagando por isso e desde que sejam respeitados o conforto e a liberdade de banhistas e pedestres. Mas há indícios de que o «turismo» praticado por esses estabelecimentos continua sendo predatório -- a eterna briga de foice para faturar em dois ou três meses o que os sustentará nos outros meses.

-- A despeito dos quatro itens anteriores, mantenham o foco e, como diz o Bilu, busquem conhecimento. Certamente os quatro itens anteriores não são miudezas para quem sofreu danos com eles. Na enchente na Barra Velha houve quem teve seu carro, estabelecimento ou imóvel danificado. Um advogado deve ajudar nisso -- porque em logradouros públicos e na relação entre cidadãos e poder público há direitos e deveres. Para nós, ciclistas, a situação ruim também deve ser contornada com civilidade ao guidão e estudo -- conhecer direitos e deveres também ajuda. E, mais do que isso, é importante saber que o que dá origem a problemas como os citados antes é justamente a falta de conhecimento e de consciência. Assim, que possamos nos manter atentos aos problemas do dia-a-dia, sem esquecer o nosso lugar e nossa condição nesse contexto.

sábado, janeiro 01, 2011

O que o turista quer?

Artigo publicado no jornal canalABERTO em dezembro de 2010. Para ler na íntegra, clique aqui.

O turista que vem para Ilhabela não busca a alta gastronomia ou o conforto cinco estrelas típicos das metrópoles. Ele busca a simplicidade de um lugar que há poucas décadas era completamente inacessível. Como eu sei disso? Por um motivo bem simples, uma regra universal que não se limita apenas ao turismo: só vale a pena deslocar-se até um lugar se o seu objetivo é encontrar o que só existe nele.